Por que empréstimos podem ajudar na construção do score
No imaginário popular, “dívida” é uma palavra proibida. Crescemos ouvindo que quem deve ao banco está em apuros e que a liberdade financeira significa não dever nada a ninguém. Embora viver sem dívidas seja um ótimo objetivo, existe um paradoxo no mundo do crédito que poucos conhecem: para ter um score alto, você precisa ter dívidas.
Parece confuso? Pense da seguinte forma: o score de crédito (Serasa, Boa Vista, SPC) é uma nota que mede a sua reputação de pagador. Se você nunca pede dinheiro emprestado, como o mercado vai saber se você é um bom pagador? Você é uma folha em branco.
Neste guia definitivo, vamos desvendar como a contratação estratégica de um empréstimo pode ser a ferramenta que faltava para tirar seu score da estagnação e levá-lo para a zona de excelência (acima de 700 pontos), abrindo portas para financiamentos imobiliários e cartões Black no futuro.
A Lógica do Algoritmo: Como o Score de Crédito realmente funciona?

Para entender por que um empréstimo ajuda, precisamos dissecar o cérebro dos birôs de crédito. O score não é um número aleatório; ele é um cálculo matemático baseado em comportamento.
Antigamente, o sistema brasileiro olhava apenas para o Cadastro Negativo (quem estava com o nome sujo). Se você não estivesse na lista de inadimplentes, seu nome era “limpo”. Mas isso não dizia se você era um ótimo pagador ou apenas alguém que não consumia nada.
Com a chegada do Cadastro Positivo, o jogo mudou. Agora, os algoritmos analisam:
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Histórico de Pagamentos (A fatia mais importante): Você paga suas contas em dia?
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Utilização de Crédito: Quanto do seu limite você usa?
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Mix de Crédito: Você só tem cartão ou tem outros produtos financeiros?
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Tempo de Crédito: Há quanto tempo você é cliente dos bancos?
É no item 1 e no item 3 que o empréstimo entra como um poderoso aliado.
O Poder do “Histórico de Pagamento” no Cadastro Positivo
Imagine que você quer emprestar R$ 1.000,00 para um amigo.
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Amigo A: Nunca te pediu dinheiro. Você não sabe se ele paga bem.
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Amigo B: Já te pediu dinheiro três vezes e pagou todas as vezes exatamente no dia combinado.
Para quem você emprestaria com mais tranquilidade? Para o Amigo B. O banco pensa igual.
Quando você contrata um empréstimo e paga as parcelas rigorosamente em dia, você está enviando informações valiosas para o Cadastro Positivo todos os meses. Cada parcela paga é um “ponto positivo” registrado no seu currículo financeiro.
O algoritmo do score entende que você assumiu um compromisso de médio/longo prazo e está honrando-o. Isso gera confiabilidade. Pessoas que não têm parcelamentos ativos têm menos dados circulando no sistema, o que pode deixar o score estagnado, mesmo com o nome limpo.
A Importância do “Mix de Crédito” para a Saúde Financeira
Este é um segredo que os especialistas em crédito dos EUA (onde o sistema de score é muito antigo) sempre ensinam: diversificação.
Se o seu histórico de crédito resume-se apenas a um cartão de crédito que você paga o valor mínimo ou usa muito pouco, o birô de crédito tem uma visão limitada de você.
Ao contratar um empréstimo pessoal, um financiamento de veículo ou um crédito consignado, você adiciona um novo tipo de produto ao seu perfil.
Isso mostra aos bancos que você é capaz de gerenciar diferentes tipos de responsabilidades financeiras simultaneamente. Um consumidor que gerencia bem um cartão de crédito E um empréstimo parcelado é visto estatisticamente como menos arriscado do que alguém que só tem um cartão pré-pago.
Empréstimo Pessoal vs. Cartão de Crédito: O Impacto na Pontuação
Muitas pessoas usam o cartão de crédito para tudo, inclusive para parcelar compras grandes. Porém, para o score, o empréstimo pode ser mais saudável do que estourar o limite do cartão.
O Perigo da “Utilização de Limite” no Cartão
O score é muito sensível ao uso do limite do cartão. Se você tem um limite de R$ 2.000,00 e gasta R$ 1.900,00 todo mês, o algoritmo entende que você está “enforcado”, vivendo no limite da sua capacidade. Isso derruba sua pontuação, mesmo que você pague em dia.
A Vantagem do Empréstimo Parcelado
O empréstimo pessoal funciona diferente. Ele é uma dívida parcelada (Installment Debt), não uma dívida rotativa.
Quando você pega um empréstimo para quitar o cartão ou fazer uma compra, você libera o limite do seu cartão de crédito.
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Resultado: Sua utilização de crédito no cartão cai (o que sobe o score) e você ganha um histórico de pagamento parcelado no empréstimo (o que também sobe o score). É uma vitória dupla, desde que a parcela do empréstimo caiba no seu bolso.
Construindo Crédito do Zero: A Estratégia do “Empréstimo de Construção”

Para jovens que acabaram de fazer 18 anos ou pessoas que passaram anos sem conta em banco, o score costuma ser baixo por falta de dados.
Uma estratégia comum (mas que deve ser feita com cautela) é pegar um pequeno empréstimo mesmo sem precisar urgentemente do dinheiro, apenas para construir histórico.
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Você pega um valor baixo no banco digital.
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Deixa o dinheiro guardado rendendo em uma conta (para não gastar).
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Usa esse mesmo dinheiro para pagar as parcelas do empréstimo.
Atenção: Você vai perder dinheiro com os juros (a diferença entre os juros do empréstimo e o rendimento da conta). Encare isso como um “investimento” para comprar a confiança do banco. Só faça isso se os juros forem baixos e se você tiver disciplina total.
O Risco Reverso: Quando o empréstimo derruba o seu Score
Nem tudo são flores. É crucial alertar seu leitor que a estratégia pode sair pela culatra se não for bem executada. Existem três momentos em que o empréstimo prejudica sua nota:
1. No Momento da Solicitação (Hard Inquiry)
Quando você pede um empréstimo, o banco consulta seu CPF. Essa consulta (chamada de Hard Inquiry) derruba seu score levemente e temporariamente. O sistema pensa: “Ele está desesperado por dinheiro”.
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Dica: Não peça empréstimo em 5 bancos ao mesmo tempo. Faça simulações sem compromisso antes de formalizar o pedido.
2. O Atraso no Pagamento
Se um empréstimo pago em dia é o melhor amigo do score, um empréstimo atrasado é o pior inimigo. O impacto negativo de um atraso é muito mais forte e rápido do que o impacto positivo do pagamento. Um único atraso de 10 dias pode anular meses de bom comportamento.
3. Comprometimento de Renda Excessivo
O Banco Central possui um sistema chamado SCR (Registrato). Todos os bancos veem suas dívidas lá. Se a parcela do empréstimo comer 50% do seu salário, seu score pode não subir tanto, pois o sistema entende que qualquer imprevisto fará você dar o calote. O ideal é que as parcelas não passem de 30% da sua renda.
O Papel do Registrato (SCR) do Banco Central
Além do Score da Serasa/Boa Vista, existe o “Score Interno” dos bancos, que é fortemente baseado no Registrato.
O Registrato mostra todas as suas dívidas ativas.
Ter um empréstimo ativo no Registrato que está sendo pago em dia (“a vencer”) é excelente. Mostra para qualquer outro banco que consultar seu CPF que você é um cliente ativo e adimplente. Isso facilita, por exemplo, conseguir um financiamento imobiliário no futuro, pois o gerente verá que você tem histórico de honrar contratos longos.
Estratégias Práticas: Como usar o empréstimo para alavancar seu perfil
Se você decidiu usar essa ferramenta, siga este passo a passo para garantir a eficiência:
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Limpe a Casa Primeiro: Não adianta pegar empréstimo se você tem restrições (nome sujo). Negocie as dívidas antigas primeiro.
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Atualize seus Dados: Garanta que seu endereço e renda estão atualizados nos birôs e no banco.
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Escolha o Crédito Certo: Prefira modalidades com juros baixos, como Crédito Consignado ou Antecipação de FGTS. Eles impactam o score positivamente e custam menos.
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Pague Antes do Vencimento: Se possível, pague a parcela 2 ou 3 dias antes. Isso evita problemas com compensação bancária e mostra organização.
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Monitore: Use os aplicativos da Serasa e Boa Vista para acompanhar a evolução da nota mês a mês. Lembre-se que o efeito não é imediato; pode levar de 3 a 6 meses para o score subir consistentemente.
Empréstimo para Pagar Dívidas: A Troca Inteligente

Uma das formas mais eficazes de subir o score rapidamente é trocar uma “dívida ruim” por uma “dívida boa”.
A Dívida Ruim é o rotativo do cartão ou o cheque especial. Elas têm juros abusivos e sinalizam descontrole financeiro.
A Dívida Boa é um empréstimo pessoal estruturado, com juros menores e prazo definido.
Ao pegar um empréstimo para quitar o cartão:
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Você estanca a sangria dos juros compostos.
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Seu nome sai da lista de quem usa rotativo (o que é péssimo para o score).
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Você libera limite no cartão.
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Você cria um histórico de pagamento parcelado.
É uma manobra cirúrgica que salva seu bolso e sua reputação no mercado.
A Dívida como Ferramenta de Construção
Como vimos, o empréstimo não é necessariamente um vilão. No complexo ecossistema financeiro atual, ele é uma ferramenta. Como um martelo, ele pode servir para construir uma casa ou para machucar o dedo – tudo depende de como você o utiliza.
Para o consumidor que deseja ter um score de elite, ter um histórico de crédito ativo, diversificado e pago rigorosamente em dia é fundamental. O empréstimo, quando bem planejado e dentro do orçamento, é a prova cabal que você dá ao mercado de que sua palavra vale dinheiro.
Se o seu score está travado mesmo você pagando tudo à vista, talvez o que falte no seu perfil seja justamente demonstrar sua capacidade de gerenciar um contrato de crédito. Analise suas finanças, simule com consciência e use o sistema a seu favor.