novembro 21, 2025


Como funciona a amortização?

Como funciona a amortização?

Se você já fez, ou planeja fazer, um financiamento de alto valor — como o de um imóvel ou um carro — você provavelmente já se deparou com um documento chamado “planilha de evolução da dívida”. E, talvez, tenha tomado um susto.

Nos primeiros meses, ou até anos, de pagamento, parece que o valor total que você deve (o famoso saldo devedor) mal se mexe. Você paga a parcela religiosamente, mas a dívida principal parece teimar em não diminuir. Por que isso acontece?

A resposta está em entender um dos conceitos mais importantes do mundo das finanças, mas que é pouco explicado pelos bancos: a amortização.

A maioria das pessoas foca apenas no valor da parcela, perguntando: “Eu consigo pagar R$ 2.000 por mês?”. Essa é a pergunta errada. A pergunta certa é: “Dos R$ 2.000 que estou pagando, quanto é juros e quanto é, de fato, amortização?”

Dominar esse conceito é a diferença entre passar 30 anos pagando por um imóvel ou quitar o mesmo imóvel em 10 ou 15 anos, economizando o valor de um segundo apartamento no processo.

Neste guia completo, vamos desmistificar tudo sobre amortização. Vamos explicar de forma simples, sem “financês”, o que é, como funciona, os tipos que existem (SAC e Price) e, o mais importante, como usar a amortização a seu favor para construir sua liberdade financeira.

O que é Amortização de Dívida? (A Definição que o Banco Não Explica)

O que é Amortização de Dívida? (A Definição que o Banco Não Explica)

Vamos começar com uma analogia simples.

Imagine que sua dívida (o valor total que você pegou emprestado) é uma pizza gigante. Os juros são a “taxa de entrega” que o banco cobra todo santo mês por ter lhe adiantado essa pizza.

Quando você paga sua parcela mensal, você não está apenas pagando pela pizza. Você está pagando a taxa de entrega (juros) e um pedacinho da pizza (principal).

Amortização é o ato de pagar o principal. É o quanto do seu pagamento mensal é usado para realmente diminuir o tamanho da sua dívida original.

Toda parcela de um financiamento é composta por duas partes:

  1. Juros: É o custo do dinheiro, o “aluguel” que o banco cobra por emprestar. Esse dinheiro não reduz sua dívida. Ele é o lucro do banco.

  2. Amortização (Principal): É o pagamento que abate o valor original que você pegou. É o único dinheiro que efetivamente “mata” sua dívida.

O grande problema é que, dependendo do sistema do seu contrato, nos primeiros anos, sua parcela pode ser 80% juros e apenas 20% amortização. Você paga, paga, paga, mas está apenas “alimentando” o banco, sem diminuir sua dívida de forma eficaz.

Compreender isso é o primeiro passo para virar o jogo.

A Batalha Clássica: Sistema SAC vs. Tabela Price

Quando você assina um contrato de financiamento (especialmente imobiliário), o banco lhe oferece, basicamente, dois “cardápios” para pagar sua dívida. São os chamados “Sistemas de Amortização”. Os mais famosos no Brasil são o SAC e a Tabela Price.

A escolha entre eles é, talvez, a decisão financeira mais importante que você fará no contrato, pois ela define quanto de juros você pagará no total.

1. Sistema de Amortização Constante (SAC): A Parcela que Diminui

Como o próprio nome diz, no SAC, o valor da amortização é constante. Ou seja, o pedaço da “pizza” (principal) que você paga é o mesmo do início ao fim.

Como funciona na prática:

Imagine um empréstimo de R$ 100.000 para pagar em 100 meses.

No sistema SAC, a amortização (principal) será fixa: R$ 100.000 / 100 meses = R$ 1.000 por mês.

Sua parcela será = R$ 1.000 (Amortização Fixa) + Juros

  • Na Parcela 1: Os juros são calculados sobre o saldo devedor total (R$ 100.000).

  • Na Parcela 2: Você já pagou R$ 1.000 de amortização. Seu saldo devedor caiu para R$ 99.000. Os juros agora são calculados sobre R$ 99.000 (ou seja, juros menores).

  • Na Parcela 3: Seu saldo devedor é R$ 98.000. Os juros caem mais um pouco.

Consequência: Como os juros caem a cada mês, o valor total da sua parcela também diminui ao longo do tempo. A primeira parcela é a mais cara de todas, e a última é a mais barata.

  • Vantagens do SAC:

    • Você paga menos juros no total.

    • O saldo devedor é reduzido mais rapidamente.

    • A sensação de “progresso” é maior.

    • O risco de inadimplência diminui no futuro, já que as parcelas caem.

  • Desvantagens do SAC:

    • A primeira parcela é a mais alta, exigindo uma renda inicial maior para aprovação do financiamento.

2. Tabela Price (Sistema Francês): A Parcela Fixa

Na Tabela Price, a regra de ouro é: a parcela é fixa do início ao fim. É o sistema preferido de quem busca previsibilidade no orçamento. “Vou pagar R$ 1.500 pelos próximos 30 anos.”

Mas… como a parcela fica fixa se os juros diminuem a cada mês (já que o saldo devedor diminui)?

Aqui está o “truque” da Price: a composição da parcela muda drasticamente.

  • No início do contrato: Sua parcela é quase inteiramente composta por juros. A amortização (o que diminui a dívida) é minúscula.

  • No fim do contrato: Sua parcela é quase inteiramente amortização, com juros muito baixos.

Consequência: No sistema Price, você passa os primeiros anos do financiamento pagando, essencialmente, o lucro do banco. A sua dívida principal demora muito para começar a cair de forma significativa.

  • Vantagens da Price:

    • Parcela fixa, o que facilita o planejamento financeiro mensal.

    • A parcela inicial é menor que a do SAC, facilitando a aprovação do crédito.

  • Desvantagens da Price:

    • O valor total de juros pagos ao final do contrato é muito maior que no SAC.

    • A amortização é lenta, dando a sensação de “não sair do lugar”.

    • É mais vulnerável à inflação (em contratos corrigidos pela TR ou IPCA).

SAC vs. Price: Qual o Melhor para o Seu Bolso?

Vamos ser diretos: do ponto de vista puramente financeiro, o Sistema SAC é quase sempre superior. Você quita sua dívida mais rápido e paga, no total, muito menos juros para o banco.

A Tabela Price só é vantajosa em uma situação: se o valor da parcela inicial do SAC não couber no seu orçamento e a única forma de conseguir o financiamento for com a parcela fixa (e menor) da Price.

Resumo da Comparação:

Característica Sistema SAC Tabela Price
Valor da Parcela Decrescente (começa alta, termina baixa) Fixa (constante durante todo o período)
Amortização (Principal) Constante Crescente (começa baixa, termina alta)
Juros Decrescente (rápido) Decrescente (lento)
Velocidade da Quitação Mais rápida Mais lenta
Total de Juros Pagos Menor Maior
Ideal para… Quem tem renda inicial maior e quer economizar no longo prazo. Quem precisa de previsibilidade e uma parcela inicial menor.

Amortização Extraordinária: O Segredo para Sair do Financiamento Anos Antes

Agora, vamos entrar na parte mais poderosa deste guia. O que explicamos até agora é a “amortização comum”, aquela que acontece todo mês dentro da sua parcela.

Mas existe algo chamado Amortização Extraordinária (ou Abatimento).

Isso é, simplesmente, fazer um pagamento extra ao banco, a qualquer momento, com o objetivo exclusivo de abater o saldo devedor.

Pense no seu 13º salário, um bônus da empresa, a restituição do Imposto de Renda ou aquele dinheiro que você conseguiu guardar. Em vez de deixar esse dinheiro na poupança, você pode usá-lo para “atacar” sua dívida.

Por que isso é tão poderoso?

Porque 100% do valor de uma amortização extraordinária vai direto para o principal. Esse dinheiro não paga juros. Ele “mata” a dívida na origem.

E o efeito disso é exponencial.

Ao reduzir o principal hoje, você elimina todos os juros futuros que incidiriam sobre aquele montante. Você não está apenas pagando uma parcela do futuro; você está apagando dezenas de parcelas futuras do seu cronograma.

Um único pagamento extra de R$ 10.000 hoje pode significar uma economia de R$ 30.000 ou R$ 40.000 em juros ao longo da vida do contrato.

Reduzir Prazo ou Diminuir Parcela? A Decisão Estratégica

Reduzir Prazo ou Diminuir Parcela? A Decisão Estratégica

Quando você faz uma amortização extraordinária, o banco é obrigado por lei a lhe dar duas opções. Esta é a segunda decisão financeira mais importante do seu contrato.

Você quer usar esse dinheiro extra para:

  1. Reduzir o Valor da Parcela, mantendo o mesmo prazo final.

  2. Reduzir o Prazo do Financiamento, mantendo o valor da parcela.

Qual é a melhor? Novamente, depende do seu objetivo.

Opção 1: Reduzir o Valor da Parcela

Ao escolher esta opção, seu pagamento mensal diminui. Se você pagava R$ 2.000, talvez passe a pagar R$ 1.900. O prazo final do contrato (ex: 360 meses) não muda.

  • Vantagem: Gera um alívio imediato no seu fluxo de caixa. Se as parcelas estão pesando no seu orçamento mensal, essa é uma ótima forma de “abrir espaço” para respirar financeiramente.

  • Desvantagem: Esta é a opção menos eficiente do ponto de vista financeiro. A economia total de juros é muito menor, pois você continua pagando juros (embora menores) pelo prazo total do contrato.

Opção 2: Reduzir o Prazo do Financiamento

Nesta opção, o valor da sua parcela (R$ 2.000) continua o mesmo. O que muda é o prazo final. Em vez de terminar de pagar em 360 meses, você talvez termine em 340 meses.

  • Vantagem: Esta é, de longe, a opção financeiramente mais inteligente. Você “mata” as últimas parcelas do seu financiamento. Ao fazer isso, você elimina completamente os juros embutidos nessas parcelas. A economia de juros no longo prazo é gigantesca.

  • Desvantagem: Não gera nenhum alívio no seu orçamento mensal. Exige disciplina para continuar pagando a mesma parcela.

Qual é o Vencedor?

Se você busca independência financeira e quer pagar o mínimo de juros possível ao banco, a resposta é clara: sempre escolha reduzir o prazo.

A única exceção é se você estiver com a “corda no pescoço” e precisar desesperadamente de mais dinheiro livre no fim do mês. Nesse caso, use a amortização para reduzir a parcela, mas crie um plano para, assim que puder, voltar a amortizar reduzindo o prazo.

Usando o FGTS para Amortizar seu Financiamento Imobiliário

Para quem tem um financiamento imobiliário dentro das regras do SFH (Sistema Financeiro de Habitação), existe uma arma poderosa: o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).

A lei permite que você use o saldo da sua conta do FGTS para amortizar sua dívida. As regras são as mesmas:

  1. Amortizar para reduzir o prazo: Você saca o FGTS e “corta” o fim da sua dívida.

  2. Amortizar para reduzir o valor da parcela: Você pode usar o FGTS para abater até 80% do valor das suas próximas 12 parcelas. Isso é útil para quem está em dificuldade financeira temporária.

Requisitos básicos para usar o FGTS:

  • Ter no mínimo 3 anos de trabalho sob o regime do FGTS (somando todos os períodos).

  • Não possuir outro imóvel na mesma cidade onde mora ou trabalha.

  • O financiamento deve ser pelo SFH (geralmente imóveis de até R$ 1,5 milhão).

  • Você deve estar em dia com as parcelas do financiamento.

Você pode fazer essa operação diretamente pelo aplicativo “Habitação Caixa” (para contratos da Caixa) ou solicitando ao seu banco. É um direito seu.

Como a Amortização Afeta Outros Produtos Financeiros?

Como a Amortização Afeta Outros Produtos Financeiros?

O conceito de amortização não vive só nos financiamentos imobiliários. Ele está em todo lugar.

Empréstimos Pessoais e Financiamento de Veículos

Funcionam de forma muito parecida. A maioria esmagadora usa a Tabela Price (parcelas fixas) para parecer mais atraente. Nesses casos, a amortização extraordinária é ainda mais vital, pois os juros são muito mais altos.

Quitar um empréstimo pessoal antecipadamente, abatendo o principal, pode gerar uma economia absurda de juros.

O Pesadelo do Cartão de Crédito: A “Amortização Negativa”

O crédito rotativo do cartão de crédito é o oposto da amortização.

Quando você paga apenas o valor mínimo da fatura, você não está amortizando nada. Você está, na maioria dos casos, pagando menos que os juros do período.

Isso significa que sua dívida principal (o que você gastou) não só não diminui, como aumenta. É a “amortização negativa”. Você deve R$ 1.000, paga o mínimo de R$ 150, e no mês seguinte deve R$ 1.050 (exemplo hipotético).

É por isso que as dívidas de cartão de crédito se tornam uma bola de neve impagável: elas não foram feitas para serem amortizadas, mas para serem “roladas”. A única forma de “amortizar” um cartão de crédito é pagar o valor total da fatura todo mês.

Consórcios

O consórcio é um caso diferente. Tecnicamente, ele não tem “juros”, mas sim uma “taxa de administração”. No entanto, o conceito de quitação antecipada existe e funciona de forma parecida.

Se você foi contemplado e está pagando as parcelas, pode fazer uma “amortização extraordinária” (chamada de quitação antecipada) para reduzir seu prazo ou o valor das parcelas. A vantagem é que, ao antecipar pagamentos, você recebe desconto na taxa de administração futura.

Outros Sistemas de Amortização (Menos Comuns)

Para completar seu conhecimento, existem outros sistemas que você pode ouvir falar:

  • Sistema de Amortização Crescente (SACRE): Usado por um tempo pela Caixa. É um híbrido. A parcela começa menor (como na Price), aumenta por um período, e depois começa a diminuir (como no SAC). A ideia era ajustar-se à expectativa de aumento de renda do cliente.

  • Sistema Americano (Pagamento Único): Raro para pessoas físicas. O devedor paga apenas juros todo mês, e o principal total é pago em uma única “paulada” no vencimento do contrato.

Amortização é o Caminho para a Liberdade Financeira

Amortização é o Caminho para a Liberdade Financeira

Se você chegou até aqui, parabéns. Você agora sabe mais sobre o seu financiamento do que 90% das pessoas.

Amortização não é um termo técnico chato; é a chave do seu cadeado financeiro.

O banco ganha dinheiro quando você foca na “parcela que cabe no bolso”. Você ganha o jogo quando foca em atacar o saldo devedor.

Não seja um pagador de parcelas passivo. Seja um amortizador de dívida ativo. Cada R$ 100 que você usa para amortizar extraordinariamente hoje está “comprando” sua liberdade futura e economizando R$ 300, R$ 400 ou R$ 500 em juros que você deixará de pagar ao banco.

O que Fazer Agora?

  1. Pegue seu Contrato: Descubra se ele é SAC ou Price.

  2. Acesse o App do Banco: Procure a seção “Financiamento” ou “Habitação”. Lá deve existir a opção de “Simular Amortização”.

  3. Faça uma Simulação: Pegue um valor pequeno, R$ 1.000, e veja a mágica acontecer. Simule quanto esse valor reduz do seu prazo ou da sua parcela.

  4. Crie um “Plano de Amortização”: Defina uma meta. “Vou usar 50% do meu 13º para amortizar” ou “Vou guardar R$ 200 por mês só para amortização extraordinária”.

Entender como a amortização funciona muda sua relação com o dinheiro. Você deixa de ser um devedor e passa a ser um estrategista.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *